Desde junho, a representação sindical tem se reunido com marítimos na sede do Sindmar, no Centro do Rio de Janeiro, com o objetivo de identificar e buscar, coletivamente, propostas para solucionar dificuldades enfrentadas pelos seus representados.
Em reuniões presenciais e on-line, com significativa participação de oficiais de máquinas que tomaram a iniciativa de procurar o sindicato após a ocorrência de grave acidente com perda de vida de um companheiro da guarnição na empresa Bram Offshore, os oficiais relataram problemas que vêm enfrentando a bordo.
Um dos pontos de maior preocupação foi relatado por oficiais da própria Bram – corroborado por companheiros da Bravante, da Marlim e de outras empresas do apoio marítimo – e diz respeito ao número de tripulantes previsto no Cartão de Tripulação de Segurança (CTS).
Segundo disseram, durante a crise mundial do petróleo ocorrida entre os anos de 2014 e 2016, que resultou em renegociação de contratos e grande pressão da Petrobras para redução de custos operacionais, o número de marítimos nas embarcações foi reduzido em relação ao anteriormente praticado pelas empresas.
Cabe ressaltar que essa redução foi aprovada pela Autoridade Marítima Brasileira, impactando os CTS de forma acordada entre a Petrobras e os armadores do apoio marítimo – alteração feita sem o consentimento dos sindicatos laborais.
Como resultado, os oficiais, especialmente os de máquinas, estão trabalhando muitas horas além do limite permitido na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e até mesmo na Convenção do Trabalho Marítimo (MLC), colocando em risco a segurança das embarcações e dos próprios tripulantes.
O CTS reduzido ao extremo pelos armadores juntamente com a Petrobras tem levado chefes e subchefes de máquinas a trabalhar à exaustão, tendo de desempenhar funções administrativas, trabalho de supervisão e tarefas operacionais extras.
Isso tudo revezando o serviço na praça de máquinas em escalas fixas inapropriadas de 12 horas de serviço por 12 horas de descanso, ao que se somam outras atividades adicionais exigidas pelo sistema de gestão integrado das empresas, requisitos da contratante e procedimentos de QSMS.
A retirada de um oficial de máquinas e do eletricista tem impactado de forma desastrosa a segurança das operações na seção de máquinas e elevado o risco de acidentes.
Com tamanha redução, se tornou humanamente impossível atender às demandas das empresas e da Petrobras como contratante, já que não param de acrescentar novos procedimentos de segurança sem que haja pessoal a bordo em número suficiente para realizar tal trabalho.
Os oficiais ressaltaram que o problema chegou a níveis extremos na praça de máquinas, mas avaliam que no passadiço também deveria haver mais um oficial de náutica para atender à carga de trabalho atualmente demandada na maior parte das embarcações.
“O que está acontecendo nesses navios é um absurdo. O trabalho do chefe de máquinas no gerenciamento é imprescindível para o bom funcionamento do navio e para a segurança da navegação e dos tripulantes”, salientou o segundo-presidente do Sindmar, José Válido.
O desvio de função é ainda mais gritante nas embarcações diesel-elétricas nas quais o CTS, atualmente, prevê apenas dois oficiais de máquinas. Há sobrecarga física e psicológica dos marítimos, que não conseguem executar o trabalho o qual deveria ser feito por quatro ou mais profissionais.
Durante as discussões, os marítimos destacaram, ainda, a necessidade de uma atualização no modelo de registro de horas trabalhadas, para evitar fraudes e descumprimento de leis trabalhistas nacionais e convenções internacionais, como a CLT e a MLC, respectivamente.
“Os marítimos estão sendo compelidos a fraudar o limite de horas trabalhadas, ocasionando riscos indesejados de acidentes, fadiga e perda de eficiência operacional dos navios”, disse um dos marítimos.
Para o presidente do Sindmar, Carlos Augusto Müller, não resta dúvidas de que houve, claramente, um movimento das empresas pela redução do CTS a níveis extremos durante a última crise no apoio marítimo.
Com uma administração focada, exclusivamente, na geração de dividendos para acionistas, a Petrobras contribuiu para essa situação, aceitando a solução proposta pelos armadores sem levar em consideração que esse modelo se mostra perigosamente insustentável.
“Os marítimos desejam ajustes para poderem ter segurança e saúde em suas atividades, valorização na carreira e respeito. O Sindmar buscará dialogar com armadores, Autoridade Marítima, autoridade laboral, Petrobras, Ministério Público e com as demais entidades da organização sindical marítima brasileira sobre essa situação e direcionar as demandas definidas com os seus representados”, afirmou Carlos Müller.
As três reuniões realizadas pela diretoria do Sindmar nas últimas semanas possibilitaram identificar as principais questões demandadas pelos marítimos – especialmente aquelas apresentadas pelo pessoal de máquinas –, as quais estarão na pauta da entidade sindical em sua atuação:
1) Necessidade de reavaliação dos CTS de diversas embarcações do apoio marítimo para incluir três ou mais oficiais de máquinas, um eletricista e quatro oficiais de náutica como parâmetros mínimos.
2) Modernização do currículo da EFOMM para capacitação de excelência dos oficiais, contemplando novas tecnologias em uso.
3) Valorização do CFM e do SCM na questão salarial, de forma compatível com a realidade atual.
4) Avaliação do excesso de burocracia relacionada a qualidade, segurança, meio ambiente e saúde (QSMS) requerida além do ISM Code para devido ajuste.
5) Avaliação da atual sistemática de registro das horas trabalhadas a bordo, pois há claras evidências de que não é possível permanecer dentro dos limites com um CTS tão reduzido.
6) Revisão dos níveis da carreira de oficial de máquinas, em atendimento ao STCW e a exemplo do que é praticado em outros países com tradição marítima.