Na última semana do mês de julho, um oficial de máquinas brasileiro associado do Sindmar foi vítima de grave acidente durante a operação do incinerador de um navio de bandeira de conveniência afretado pela Petrobras.
Com a sua mão presa na câmara de queima, o oficial teve de aguardar aterrorizantes minutos até que outros tripulantes chegassem ao local e conseguissem cortar o suprimento de ar e combustível para parar o equipamento. Os dispositivos de segurança, por algum motivo, não funcionaram.
O acidente, que resultou na amputação da mão do trabalhador, poderia ter sido evitado se a bordo do petroleiro das Ilhas Marshall houvesse um programa efetivo voltado à segurança, meio ambiente e saúde dos marítimos (SMS) compatível com o que a Petrobras pratica nos navios de bandeira brasileira.
Vale lembrar que enquanto os navios brasileiros da Transpetro alcançam elevado desempenho em SMS e se destacam no sistema Petrobras, na frota estrangeira afretada pela estatal, que conta com mais de 80 navios na cabotagem, os marítimos encontram em águas nacionais, praticadas de maneira contínua, as piores condições do mercado neste sentido. Em algumas situações, os trabalhadores já não têm certeza se voltarão para as suas casas da mesma forma como saíram.
Para acabar com essa inaceitável situação em que coexistem dois padrões distintos de SMS nos navios a serviço da Petrobras, é essencial aumentar a frota brasileira e eliminar os navios de bandeiras de conveniência de baixo padrão.
Enquanto isso não ocorre, a Petrobras necessita, com urgência, criar um grupo de trabalho com a participação dos sindicatos marítimos para implantar um programa de SMS nos navios estrangeiros afretados.
Após o acidente com o nosso associado, a representação sindical marítima enviou uma carta para a Gerência de Logística de Transporte Marítimo da Petrobras e cobrou, da empresa, um posicionamento sobre o caso, exigindo um programa eficaz para todas as embarcações.
“(…) não é possível que a empresa continue praticando, em águas brasileiras, duas condições distintas de SMS para navios nacionais afretados e navios estrangeiros afretados. Ademais, a Petrobras não pode se eximir de sua responsabilidade solidária no ocorrido. Por ter afretado a embarcação e por ser a tomadora do serviço, deveria fiscalizar adequadamente o contrato, visitando as embarcações com o objetivo de garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável, direito fundamental do trabalhador definido na OIT”, criticou a Conttmaf em trecho do documento.
Como resposta, a entidade sindical recebeu da empresa uma carta com abordagem evasiva, assinada pela gerência a qual contrata inúmeros navios estrangeiros que comprometem a segurança operacional e causam prejuízos aos interesses do Brasil. Não se sabe com que motivação, mas certamente sem contemplar os interesses dos trabalhadores nacionais e do Estado brasileiro.
Com frases-padrão sobre “modelo de inspeção” nas embarcações e outras alegações inconclusivas relacionadas à assistência prestada ao oficial, a carta promete um relatório sobre o acidente, porém, a empresa nem ao menos convidou um representante do Sindmar para participar da produção do mesmo.
A Petrobras diz, ainda, que após essa investigação (pouco transparente) emitirá “um novo alerta com informações adicionais”, entre outras iniciativas de praxe que não atendem aos anseios dos trabalhadores marítimos brasileiros.
Cabe ressaltar que não houve apropriada divulgação, até aqui, de alerta inicial, e há centenas de marítimos brasileiros empregados nesses navios contratados pela Petrobras em que se pratica SMS de segunda linha.
O presidente do Sindmar e da Conttmaf, Carlos Augusto Müller, lembra que sem um programa efetivo de SMS para reduzir os riscos de acidentes a bordo de navios de outras bandeiras que operam continuamente em águas brasileiras, a Petrobras torna-se a maior indutora de trabalho marítimo em condições inseguras, que afrontam a integridade física e a saúde de suas tripulações, e mutilam trabalhadores marítimos.
“Temos observado com perturbadora frequência navios afretados pela Petrobras que operam em condição “sub-standard” – especialmente no que se refere a questões laborais, de segurança, meio ambiente e saúde – o que levou a Organização Sindical Marítima brasileira a criar em 2016 a campanha contra os “navios piratas”, geralmente registrados em bandeiras de conveniência”, informa na carta à Petrobras.
Segundo o dirigente sindical, a empresa também concede aos navios estrangeiros privilégios concorrenciais indecentes em comparação ao que é oferecido aos brasileiros e não exige a bordo destas embarcações de bandeira de conveniência o mesmo padrão de SMS que possui em suas próprias unidades.
“Operar navios em condições elevadas de SMS tem um custo grande também. Ao permitir um padrão tão baixo em águas nacionais, a Petrobras distorce os custos operacionais e estimula o que há de pior em nossas águas. Isso acaba inviabilizando financeiramente os navios brasileiros que são operados nos melhores padrões de segurança”, avalia.
Para ele, o descaso e a falta de sensibilidade da gerência da Petrobras persistem em relação aos trabalhadores marítimos.
“Buscaremos sensibilizar as autoridades para esse inaceitável desequilíbrio nos padrões de SMS praticados em águas nacionais pela Petrobras em suas atividades marítimas. O governo brasileiro deveria estabelecer uma força-tarefa para acabar com essas operações inseguras e prejudiciais à saúde dos marítimos”, finaliza Müller.