A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) informou, por carta, ter instaurado processos de fiscalização de dez empresas de navegação que operam no transporte de cargas de cabotagem entre Recife (PE) e Fernando de Noronha (PE), a fim de apurar fatos denunciados pelo Sindmar.
No fim do mês passado, chegaram ao conhecimento da representação sindical informações sobre uma sucessão de naufrágios ocorridos na última década, no tráfego comercial doméstico entre o continente e o arquipélago, envolvendo embarcações nas quais atuam representados do Sindicato.
As embarcações de carga transportam essencialmente material de construção e itens de consumo que possibilitam o funcionamento do paraíso turístico. A navegação nesse trecho ocorre em mar aberto, numa distância de 294 milhas náuticas (540 km), percurso que eventualmente pode durar mais de 24 horas.
Segundo apuração do Sindmar, nos últimos anos foram registrados os naufrágios de pelo menos sete embarcações: Poty Boat (2016), Além-Mar (2016), Navemar XII (2017), Jaqueline 2 (2018), Ekos Noronha (2019), Navegantes (2022) e Thais IV (2022).
Em 21 de junho do ano passado, o navio de transporte de cargas Thais IV, da empresa Jaqueline, saiu do Porto do Recife carregando materiais diversos em direção a Fernando de Noronha. No dia seguinte, o barco naufragou no litoral norte da Paraíba. Dos oito ocupantes, quatro foram encontrados com vida, dois morreram e tiveram os corpos resgatados do mar e outros dois permanecem desaparecidos.
“Se voltarmos à década de 1990, encontraremos mais registros de acidentes. Como são embarcações de carga, a mídia não deu grande destaque aos sinistros. O comportamento provavelmente seria outro se, em vez de trabalhadores mercantes, as vítimas fossem turistas. Estou certo de que a repercussão teria sido muito maior e provavelmente não haveria essa absurda repetição de acidentes, que configura uma verdadeira ‘travessia da morte’”, afirma Rinaldo Medeiros, delegado do Sindmar na região Nordeste.
Quando tomou conhecimento desses fatos, o Sindicato abriu um canal de comunicação com os marítimos que atuam na travessia e vem recebendo diversos relatos assustadores sobre as péssimas condições das embarcações operadas por algumas empresas.
Ao buscar compreender as causas de tantos incidentes, chegou-se à que parecia ser a mais provável: o excesso de carga. Diversos tripulantes e ex-tripulantes que atuaram em diferentes empresas na rota Recife-Noronha denunciaram ao Sindmar que, após serem realizadas as inspeções regulamentares da Capitania dos Portos, os barcos, à noite, recebiam cargas adicionais e até passageiros clandestinos.
“Até onde se conseguiu apurar, a maior parte das embarcações que afundaram estava sobrecarregada. Houve uma que estava tão carregada que saiu do Recife adernada e, mesmo com mar tranquilo, acabou afundando próximo a Olinda”, conta Rinaldo.
Um levantamento realizado pelo Sindmar revelou que as empresas que operam nessa rota, em sua maioria, praticam péssimas condições laborais, o que foi denunciado ao Ministério Público do Trabalho (MPT). A travessia de mar aberto nessas circunstâncias é extremamente preocupante e denota negligência, omissão e descaso com a vida humana no mar.
Em novembro passado, em Fernando de Noronha, a embarcação Topa-Tudo teve um incêndio a bordo causado pelas más condições de manutenção em que se encontrava a praça de máquinas. O salvamento da tripulação foi feito por turistas que passeavam em veleiros, nas proximidades.
Além das denúncias feitas ao MPT e à Antaq, a representação sindical encaminhou comunicados à inspeção do trabalho do MTE, à Capitania dos Portos de Pernambuco, à Anvisa, à OAB e a outras autoridades locais informando sobre os problemas de excesso de carga e as péssimas condições laborais nas embarcações que operam a rota Recife-Noronha, e irá acompanhar os desdobramentos.