Em mais uma ação contra os trabalhadores, o governo federal patrocinou a aprovação da Lei 13429/2017, que torna irrestrita a aplicação da terceirização, na iniciativa privada e no serviço público, nas atividades meio e nas atividades fins. Para conseguir uma lei de terceirização em tempo recorde, o governo apresentou o Projeto de Lei – PL 4330, que, por avaliação da intensidade dos seus danos, tinha sido descartado há 15 anos em alguma gaveta na Câmara dos Deputados.
É mais uma manobra de um governo sem voto e sem legitimidade, que firmou obrigações e compromissos com grupos empresariais, financeiros e de mídia para chegar ao poder. Isso explica o paradoxo de se ter todo o núcleo do governo e da sua base de apoio parlamentar envolvido em escândalos de corrupção, a despeito de ter pegado carona na legítima indignação do povo brasileiro contra a corrupção.
A terceirização, desenvolvida a partir dos anos 90 nos Estados Unidos e no Japão visando ao ganho de eficiência das empresas, chegou ao Brasil, já naquela época, totalmente focada na redução de custos, que na prática implica efetiva redução dos direitos dos trabalhadores. Nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE, a terceirização foi promovida como geradora de novos postos de trabalho, o que essa organização em suas avaliações mais recentes considera ter sido um erro de cálculo.
No Brasil, nesse mesmo período em que a desregulamentação do trabalho avançou, a quantidade de auditores fiscais do trabalho reduziu-se a número menor do que em 1990, com mil vagas não ocupadas e pouco mais de 2.500 auditores na ativa. Um novo fenômeno foi provocado pela terceirização: as empresas quando não recolhem o Fundo de Garantia – FGTS e não respeitam os direitos dos trabalhadores, sendo flagradas pela fiscalização mudam a razão social – o nome o registro – para continuarem a funcionar, descartando os seus empregados anteriores e ignorando os prejuízos causados. A desregulamentação combinada com a falta de fiscalização torna os números da terceirização assustadores.
Hoje, conforme dados do Ministério do Trabalho, 26 em cada 100 trabalhadores brasileiros são contratados por empresas terceirizadas, mas 81% das ocorrências de trabalho análogo ao de escravo atingem a esses terceirizados, assim como sete em cada dez casos de acidentes de trabalho. A insegurança e a precarização do trabalho fazem que esses 26% dos trabalhadores gerem quase 40% dos processos na Justiça do Trabalho. Pior: de todos os trabalhadores terceirizados contratados ao longo de um ano, 64% perdem o emprego nesse mesmo prazo, o dobro do que acontece com os trabalhadores diretos. Essa desproporção entre a quantidade de empregados terceirizados e a altíssima participação deles nos prejuízos que se abatem sobre o conjunto dos trabalhadores brasileiros acontece sob uma legislação ainda restritiva.
Para se ter uma noção do alcance da nova lei, tome-se como exemplo uma das categorias mais transformadas pela terceirização desde a década de 1990. Naquela época, os bancários em todo o Brasil somavam um milhão de trabalhadores diretos e 200 mil terceirizados. Atualmente, eles foram reduzidos a 400 mil e os terceirizados já são um milhão e quatrocentos mil trabalhadores no setor. Essa transformação foi possível sob a permissão de se terceirizar apenas as atividades meio, como consta na Súmula 331/2011 do Tribunal Superior do Trabalho – TST.
Com a nova lei, a permitir a terceirização nas atividades fins, prevê-se a inversão da proporção de 26% de empregados terceirizados na força de trabalho brasileira. Em pouco tempo, essa pode ser a proporção dos empregados diretos, com os terceirizados chegando a três a cada quatro trabalhadores no País. Em vez de elevação da condição dos terceirizados, rebaixam-se as condições e os direitos dos empregados diretos. Esse é o fenômeno conhecido como mexicanização, por causa da implantação ostensiva desse modelo naquele país. Por ele, as ameaças aos direitos dos trabalhadores são garantidas por desregulamentação brutal, como definida na nova lei, que estende o período de experiência de 90 para 180 dias, podendo ter uma segunda extensão de mais 90 dias, totalizando nove meses de trabalho temporário.
Ao final desse período, as mulheres não alcançam o direito de estabilidade pós-parto e para todos o conjunto dos trabalhadores não há férias, nem décimo terceiro, nem seguro desemprego. Isso estendido ao longo da vida laboral, faz que a Previdência Social se torne inalcançável ao trabalhador terceirizado. Ao fim, a terceirização faz mais uma vítima: a Previdência Social, que deixa de arrecadar e sofre retração de receitas. Quem ganha com essa retirada de direitos dos trabalhadores? A Fenaprevi, federação que reúne as empresas de Previdência Privada acaba de anunciar que, em 2016, em plena crise econômica nacional, a captação líquida de suas associadas aumentou 20%. É necessário ir longe para descobrir quem mais ganha e a quem interessa a aprovação das reformas patrocinadas por esse governo a toque de caixa?
No setor marítimo, se nada for feito, a terceirização se tornará campo fértil para as empresas de fornecimento de mão de obra, para as falsas cooperativas, para a retirada dos direitos que, por meio de seus Sindicatos, os trabalhadores marítimos têm conquistado. As investidas virão de todos os lados, com oferta de mão de obra marítima de baixo custo e sem garantias sociais. Os empregados terceirizados, enfraquecidos, serão conduzidos a outras representações sindicais, mercantilistas e de fachada, minando o poder de defesa dos direitos dos trabalhadores marítimos que o SINDMAR e outros coirmãos têm hoje.
A lei aprovada ainda pode ser anulada pelo Supremo Tribunal Federal – STF, onde tramitam duas Ações de Inconstitucionalidade. Esta é a hora de nos levantarmos. De estancarmos as reformas feitas sob medida para gerar mais exclusão social. De nos juntarmos aos demais trabalhadores do Brasil na greve geral de 28 de abril. Juntos somos mais fortes!
Severino Almeida Filho
Presidente do SINDMAR